Abordagem de Ensino Baseada no Jogo

segunda-feira, 3 de outubro de 2022

RECUPERAR TREINANDO E TREINAR RECUPERANDO

 

Fig. 1 Morfociclo Padrão com jogos aos domingos
Adaptado de TAMARIT, 2013.

Em se tratando de futebol um dos assuntos mais comentados é sobre essa operacionalização dos dias entre treinos e jogos nas competições. Pois, no nosso país temos um calendário congestionado e por sua extensão territorial (um país continental) dificulta ainda mais essa questão.

Como a figura 1 nos mostra, temos os dias de uma semana civil para operacionalizar os treinos e tentar garantir aquisição e evolução a equipe quando os jogos são aos domingos. Neste caso específico vamos tratar da seguinte forma, o jogo aconteceu no domingo, então no dia +1 (segunda-feira no caso), a recuperação será passiva, pois, um fator muito importante é a fadiga mental. Destarte, tanto técnico como jogadores normalmente no dia após o jogo ainda estão fadigados mentalmente (principalmente após um resultado adverso) e o trabalho não será no mais alto nível.

Vamos nos debruçar nessa publicação sobre o dia +2 (terça-feira). A unidade de treino conta ainda com um regime de recuperação. Desta forma, os jogadores ainda se encontram em um processo de recuperação em relação ao jogo passado, o objetivo desse dia é que se recuperem em especificidade. 

Um exemplo prático será mostrado na sequência:

Campograma 1

Um jogo 10 VS 6 (nos 10 estarão os jogadores que mais atuaram durante a partida de domingo), nos 6 estarão jogadores que atuarão menos durante a partida e/ou não atuarão. A equipe em superioridade numérica tem o objetivo de circular a bola e realizar movimentações para que a bola chegue até um companheiro que está mais à frente e a conduza após a linha demarcatória sofrendo oposição dos jogadores em inferioridade numérica (azuis) que realizarão marcação da saída de bola. O objetivo do trabalho está diretamente ligado a Subprincípios que a equipe deve melhorar devido à partida anterior (bem ou mal) e o que prevemos que acontecerá na próxima partida. 

Quanto ao tempo de estímulo deve ser curto, justamente para mobilizar os aspectos bioenergéticos necessários por meio da síntese do ATP-PCr e os intervalos de recuperação são primordiais para garantir a adequada ressíntese do ATP-PCr oriunda do metabolismo aeróbio, de modo que os jogadores estejam em estados ótimos para desempenhar as repetições subsequentes dos trabalhos. Para que os jogadores se recuperem em especificidade, o padrão dos tipos de contrações musculares não deve representar um elevado nível de tensão, duração e velocidade (já para à equipe em inferioridade numérica isso será no caminho inverso). Nessa sessão de trabalho, ela deve assumir uma característica mais descontínua, com tempos menores de exercitação e intervalos de recuperação maiores. Pois, se esse perfil não for respeitado, não haverá garantia de que o metabolismo dominante seja, de fato, o anaeróbio aláctico. O objetivo é otimizar a relação entre exercitação/recuperação, de maneira a maximizar a coordenação metabólica entre a síntese e a ressíntese do ATP, de modo que os jogadores tenham a matriz de jogo incorporada em especificidade com os conjuntos de tomadas de decisão eficazes em relação aos princípios e aos subprincípios de jogo (mas nesse dia de forma menos complexa) (PIVETTI, 2012).

Nessa sessão de trabalho utilizaremos de 3 a 5 exercícios com duração de 10 a 15 minutos cada. 

Sempre buscando a harmonia entre recuperar treinando e treinar recuperando.

Boa semana!

TAMARIT, Xavier. Periodización Táctica VS Periodización Táctica: Vítor Frade aclara, MBF, 2013

PIVETTI, Bruno. Periodização tática: o futebol arte alicerçado por critérios. São Paulo: Porte, 2012.

segunda-feira, 26 de setembro de 2022

GESTÃO DOS BINÔMIOS ESFORÇO DESEMPENHO / ESFORÇO RECUPERAÇÃO NO FUTEBOL


Fig. 1: Morfociclo Padrão com Jogos aos Domingos
Adaptado de Tamarit, 2013.

Qual é a quantidade de esforço para as cadeias musculares dos membros inferiores durante o treinamento que eu programei? Qual é a qualidade desse trabalho? Após essa tarefa, qual o próximo treinamento posso desenvolver sem agravar a fadiga?

Com base nessas três questões quero levantar um debate sobre a gestão dos binômios esforço desempenho/esforço recuperação com você leitor. 

No futebol e em qualquer outra atividade física desportiva, treinamos para melhorar a forma de adaptação. E, segundo a teoria e metodologia do treinamento desportivo, temos diferentes tipos de adaptação:
  1.  Fenômenos de adaptação morfológicos;
  2. Adaptações biopositivas e bionegativas;
  3. Sistemas de adaptação rápida e lenta;
  4. Adaptações específicas e não especifícas.
Neste caso específico, vamos nos ater no item 2, adaptações biopositivas e bionegativas. Segundo Weineck,  2005, p. 14:
... se os estímulos forem apresentados qualitativa e quantitativamente de forma - observando-se a capacidade de receber carga de cada sistema biológico -, resulta uma melhora da capacidade de desempenho, pela formação de novas estruturas de suporte (adaptação biopositiva), mais propícias a um bom desempenho. Um excesso de estímulos, por outro lado, leva a uma adaptação bionegativa - também chamada de má adaptação - e apresenta uma exigência exagerada do sistema, com momento de prejuízo.

Se não soubermos quantificar a dosagem do esforço que uma atividade terá sobre a musculatura exigida, poderemos causar uma adaptação bionegativa no jogador se, não dermos o tempo de descanso necessário para essa musculatura.

Fig. 2: Supercompesação

Na figura acima podemos observar isso no sistema muscular (a) no sistema ligamentar e de sustentação (b) e após uma recuperação incompleta (c). Se isso não for respeitado, muito provavelmente os jogadores estarão trabalhando sempre em um processo aquém do que seriam capazes. Destarte, derrotas começam a surgir e o que se faz, aumentam as demandas físicas de trabalho.

Se estamos tratando do tema gestão dos binômios esforço desempenho/esforço recuperação, temos que comentar sobre o tempo, correto? Segundo Prigogine (2002, p. 21) "o reaparecimento do paradoxo tempo deve-se essencialmente a dois tipos de descobertas. O primeiro consiste na descoberta das estruturas de não equilíbrio, também chamadas de 'dissipativas'. (...)". A estrutura dissipativa só existe quando o sistema dissipa energia e permanece em interação com o mundo exterior, é isso que ocorre quando se pratica futebol. O sistema busca equilíbrio e as atividades que propomos causam desequilíbrios ao sistema (fadiga). Assim surge, outro fenômeno, o da auto-organização. De acordo com Morin (2013, p. 282-283) o fenômeno da auto-organização refere-se à aptidão de um sistema para criar novas estruturas e estabelecer um nível novo de ordem e organização, após sofrer perturbações aleatórias, de maneira que quanto mais complexos forem os comportamentos do sistema, mais ele manifestará capacidade para se adaptar em relação ao entorno.

Trabalhar o entorno, não é mudar de terreno, mas, ter a percepção de que, a movimentação dos jogadores da sua equipe e da equipe contrária como condicionantes da atuação individual do futebolista, pois, os princípios dinâmicos da tomada de decisão e de como esta surge da interação entre neurônios interconectados, se baseiam em modelos em que a decisão se associa a uma transição entre atratores, ou estados estáveis, da rede. Esta transição entre estados é induzida por "inputs" seletivos associados a um estímulo, que modifica a paisagem dos atratores do sistema, favorecendo a transição entre o atrator neutro e um atrator seletivo, associado a uma escolha categórica (MARTI ORTEGA apud POL, 2013, p. 25). E, esse processo desgasta mais do que apenas o aspecto físico. 

Apoiados na figura 1, temos o Morfociclo Padrão da metodologia de treino Periodização Tática e nele, temos o Princípio da Alternância Horizontal em Especificidade que será fundamental para entender, em parte, a essência da Periodização Tática quanto a dimensão física, se diferenciando da lógica convencional. Vítor Frade (apud TAMARIT, 2013, p. 44),
... o esforço advém de você ter que contrair músculos, ter que se mover e, por tanto, como há três indicadores que caracterizam o modo de manifestação das contrações musculares e sendo diverso o modo em relação ao prolongamento de suas manifestações e a sua fadiga, então há que calibrar bem. É a garantia de extremar ou maximizar, diagnosticando assim, em um dia um desses indicadores, no outro dia esse não, e no outro, outro. 
Fig. 3: Contrações das cadeias musculares dominantes
Adaptado de Guilherme Oliveira, 2010

Para Jorge Maciel (apud TAMARIT, 2013, p. 45) "a diferença dos regimes de desempenho envolvidos nos diferentes dias se faz levando em conta a fractalização das várias dimensões que compõe o jogar".

As contrações musculares se caracterizam por sua duração, velocidade e tensão. É sabido que durante todo exercício estas três interagem de maneira conjunta e sistemática, também sabemos que algumas aumentam sua dominância perante outras dependendo das ações (objetivos dos treinos de futebol) que se realizam (TAMARIT, 2013).  

Jorge Maciel (apud TAMARIT, 2013, p. 46) faz um relato sobre esse princípio de treino, assim, "se trata de uma alternância horizontal por se referir a necessidade de variação dos contornos do jogar e da gestão dos binômios Esforço Desempenho e Esforço Recuperação, que devem ser verificados ao longo dos vários dias que compõe o Morfociclo." 

Doravante, Frade (apud TAMARIT, 2013, p. 131) nos alerta para o estado de falência circunstancial do funcionamento de qualquer átomo ou de qualquer órgão é um estado de parabiose. Este é um processo que relata a união de elementos vivos. Neste caso, representa os estímulos qualitativos do treinamento e com o propósito de articulação que este fenômeno desencadeia, após a desestruturação gerada, faz emergir uma determinada engendração conforme o estímulo que a motivou. Se trata de um processo de auto-organização que concebe o organismo e suas partes constituintes como estruturas dissipativas susceptíveis para aspirarem níveis de complexidade crescentes. Em si, não se respeitando isso, ocorrerá a "paranecrose" (FRADE apud TAMARIT, 2013, p. 131) que é o fenômeno análogo do descrito na parabiose, pois seus efeitos, pela diferença qualitativa há nível de estímulo, pela não devida contemplação do tempo de recuperação, motiva a morte dos elementos vivos, e sua consequente perda de complexidade por parte do sistema.

Em suma, olhando para esse cenário de gestão dos binômios de esforço desempenho e esforço recuperação é importante entender que, após três dias depois da partida a equipe não está totalmente recuperada, desta forma, as atividades programadas devem ser pensadas para não agravar o processo de recuperação. Deve-se privilegiar contrações musculares com aumento significativo da tensão, mas sem esquecer de recuperar (muito descontínuo). Deve haver um grande número de contrações excêntricas (isso logicamente para aquele grupo de jogadores que jogou a maior parte do tempo da partida). Para os outros, isso será assunto para outro dia.

Boa semana!

Referências

MORIN, Edgar. Ciência com consciência. 15 ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2013.

PRIGOGINE, Ilya. As leis do caos. São Paulo: Editora UNESP, 2002.

POL, Rafel. La Preparación Física en el fútbol. El processo de entrenamiento desde las ciencias de la complejidad. MC Sports, 2013.

TAMARIT, Xavier. Periodización Táctica VS Periodización Táctica: Vítor Frade aclara. MBF, 2013.

WEINECK, Jürgen. Biologia do Esporte. 7 ed. Barueri - SP: Manole, 2005. 

segunda-feira, 19 de setembro de 2022

MODELO DE CARGAS SELETIVAS VS PERIODIZAÇÃO TÁTICA

Fig. 1 Antônio Carlos Gomes (esquerda) Vítor Frade (direita) 

(...) O êxito no futebol tem mil receitas. O treinador deve crer numa, e com ela seduzir os seus jogadores.
Valdano
Em se tratando de futebol não podemos deixar de pensar nas várias formas de se preparar/treinar. 

No Brasil foi criado um modelo de periodização (Prof.: Dr. Antônio Carlos Gomes) para atender o calendário dos desportos coletivos, principalmente, o futebol, que, por apresentar uma grande quantidade de jogos na temporada, dificulta a distribuição das cargas de treinamento no macrociclo. O modelo nasce em virtude de o futebol não apresentar tempo hábil (grande reclamação dos treinadores no início do ano) para uma boa preparação dos jogadores antes do início da temporada (GOMES, 2009).

Como os jogos desportos coletivos de invasão (JDCI), de forma geral, não exigem o desenvolvimento das capacidades máximas e, sim, submáximas, nos últimos anos, foi elaborado um modelo de organização de cargas na temporada que permanece durante todo o ciclo com o volume inalterado, procurando uma forma de qualificação durante toda a temporada e alternando as capacidades de treinamento a cada mês durante o ciclo competitivo (GOMES, 2009).

No Modelo de Cargas Seletivas, o principal alvo do aperfeiçoamento no treinamento está nas capacidades de velocidade. Pois, na prática, verifica-se que o ciclo anual de 52 semanas deve ser subdividido em duas etapas, caracterizando, assim, uma periodização dupla com duração de 26 semanas cada (GOMES, 2009).

Com esse sistema, o volume do treinamento oscila muito pouco durante todo o ciclo anual de competições; consequentemente, a forma desportiva apresenta uma tendência de melhora durante toda a etapa, diminuindo na fase de pré-temporada em razão de uma pequena redução do volume no início da segunda etapa competitiva. O período competitivo no futebol varia de 8 a 10 meses no ano, com uma quantidade de 75 a 85 jogos na temporada (GOMES, 2009).
 
A essência da prática do futebol, não exige o desenvolvimento e o aperfeiçoamento das capacidades físicas no seu máximo. Por outro lado, trata-se de um desporto que, na sua atividade competitiva, caracteriza-se pelos esforços intermitentes executados em velocidade, com alto volume de diversas capacidades físicas e que exige capacidade anaeróbica e aeróbica (mista). Além da força e da resistência especial, utiliza também a flexibilidade para a execução dos movimentos técnicos exigidos pelo jogo (GOMES, 2009). O autor segue relatando que:
No futebol moderno, o técnico tem dificuldades de prescrever o conteúdo do treinamento, pois o calendário apresenta uma grande quantidade de jogos em âmbito regional, nacional e internacional que devem ser disputados com alto rendimento devido aos sistemas utilizados na classificação.

Em Portugal Vítor Frade criou uma outra forma de periodizar/organizar o treinamento de futebol, a Periodização Tática. Para esse autor o futebol é um jogo de dinâmicas cuja invariante estrutural é a Interação. Partindo desta perspectiva, o jogar é uma totalidade que resulta das interações dos jogadores e por isso, não deve ser interpretado como um somatório de acontecimentos aleatórios porque se inscreve num contexto coletivo. 

E quando nos referimos a Periodização Tática, não podemos esquecer que esta metodologia de treinamento em futebol, é norteada pelo Modelo de Jogo. E, o Modelo de Jogo em futebol é normalmente mal entendido. Muitos falam dele como sendo, o Sistema ou Esquema de Jogo empregado, ou, distribuição inicial adotada pelos jogadores no terreno de jogo (TAMARIT, 2007).

Corroboro com Tamarit (2007) que o Modelo de Jogo é muito mais do que isso. O autor cita uma definição de Portolés (2007) para explicar melhor o conceito de Modelo de Jogo:

[...] um Modelo de Jogo é algo que identifica uma equipe determinada. Não é só um Sistema de Jogo, não é o posicionamento dos jogadores, mas, é a forma como esses jogadores se relacionam entre si e como expressam sua forma de como veem o futebol.

Destarte, significa dizer que, o Modelo de Jogo é uma visão futura do que pretendemos que a nossa equipe realize de forma regular nos diferentes momentos do jogo (Organização Ofensiva, Transição Defensiva, Organização Defensiva e Transição Ofensiva).

Assim, a natureza do jogo caracteriza-se pela dinâmica das relações de cooperação dos colegas da equipe para transcender os próprios adversários e por isso, os problemas que se colocam às equipes e jogadores são de natureza tática (Frade, 1989 apud Gomes, 2006). Através deste conceito, enaltecemos que a adequabilidade da decisão é fundamental para resolver as dificuldades impostas pelo adversário e por isso, as exigências coletivas e individuais que se colocam são de ordem tático-técnicas, e não, técnico-tático, como sempre escutamos (GOMES, 2006). 

Em relação ao Modelo de Cargas Seletivas, o seu criador Prof.: Dr. Antônio Carlos Gomes (2009), relata que:

Os exercícios técnicos e os táticos devem estar inseridos em todo o processo do treinamento, destinando a maior parte do tempo a essas ações, pois é nelas que ocorrerá o aperfeiçoamento ótimo das capacidades competitivas do desportista.

Percebe-se com esta citação que, o autor tem preocupação de que seu método não seja descontextualizado da especificidade do jogo. Mas, não existe nenhuma referência ao Modelo de Jogo. Só referências específicas sobre as capacidades físicas que os jogadores de futebol devem ter para conseguirem vencer a maratona de jogos da temporada. Isso, de certa forma, nos remete a dicotomia que ainda insiste em se fazer presente no futebol entre o treinador e o preparador físico. Onde um só entende da parte "tática" e o outro só da "física".

Em contrapartida, quando ouvimos relatos sobre a Periodização Tática, ainda observo certa resistência por parte de alguns profissionais. Mas, para que possamos compreender melhor esta metodologia de treinamento específica para o futebol, pensando em organização coletiva, Vítor Frade (in Martins, 2003) revela que, a tática resulta deste conceito de Organização e por isso, compreende uma determinada expressão física, técnica e psicológica. Sendo assim, a Tática subentende o desenvolvimento dos princípios de ação da equipe que induzem a adaptações concretas a nível físico, técnico e psicológico. Gomes (2006), nos mostra que, face a este entendimento percebemos que a exacerbação física tem um papel subjugado ao desenvolvimento das relações entre os jogadores para assim, criar uma entidade coletiva e, portanto, uma organização. Deste modo, esta concepção desafia a Teoria Convencional do Treino uma vez que está se preocupa fundamentalmente com as aquisições físicas dos jogadores em detrimento de um entendimento coletivo e das relações que o constituem. E, nisto se enquadra o Modelo de Jogo. O Modelo de Jogo confere um determinado sentido ao desenvolvimento do processo face a um conjunto de regularidades que se pretendem observar. Deste modo, o modelo permite responder à questão: para onde vamos? A pertinência desta questão parece-nos fundamental para desenvolver um processo direcionado para um determinado JOGAR, ou seja, para um processo intencional. A partir dele criam-se um conjunto de referências que definem a organização da equipe e jogadores nos vários momentos do jogo. Deste modo, o modelo orienta o processo para um jogar concreto através dos princípios coletivos e individuais em função do que é pretendido. Neste sentido, trata-se de desenvolver um jogar Específico e não um jogar qualquer (Gomes, 2006). 

Ao analisar os dois modelos de treinamento criados para periodizar a performance em futebol, podemos dizer que a primeira (Modelo de Cargas Seletivas) está diretamente preocupado com o caráter físico do jogador e a segunda (Periodização Tática) está preocupado com um JOGAR ESPECÍFICO perspectivado pelo Modelo de Jogo, onde, o técnico assume essa responsabilidade de operacioná-lo durante a semana com o Morfociclo Padrão, que é utilizado da segunda semana de trabalho até a última e, não durante um microciclo, mesociclo ou macrociclo anual. Quanto ao preparador físico nesse cenário, o Modelo de Cargas Seletivas parece ser um terreno mais habitual (não que, não haja trabalhos com bola, muito pelo contrário), mas por se tratar de um conteúdo com o qual estamos mais familiarizados, tanto na graduação como nos cursos de especializações/extensões. Na Periodização Tática, ele precisa estar em sintomia e compreender a ideia de jogo do treinador (o seu pensamento sobre futebol), para que possa trabalhar em conjunto nos aspectos táticos e técnicos e criar exercícios que vão ao encontro dos objetivos do treinador. Sempre deixando bem claro quais são os objetivos do exercício e buscando treinar na intensidade do jogo que se propõe a realizar durante os jogos e campeonato.

Mas, temos que ter em mente que, são apenas duas formas de treinar o futebol e, claro que as duas obtêm resultados, mas, a forma de operacionalização de cada uma é totalmente diferente. Uma pautada na física e a outra, pautada no fractal, na complexidade. Que é normal causar estranheza.

Boa semana!

Referências

GOMES, A. C. Treinamento Desportivo: estruturação e periodização. 2 ed. Porto Alegre: Artmed, 2009.

GOMES, M. S. Do Pé como Técnica ao Pensamento Técnico dos Pés Dentro da Caixa Preta da Periodização Táctica - um estudo de caso- Porto, 2006.

MARTINS, F. A "Periodização Táctica" segundo Vítor Frade: Mais do que um conceito, uma forma de estar e de reflectir o futebol. FCDEF-UP. Porto, 2003.


segunda-feira, 12 de setembro de 2022

VBT NO FUTEBOL

Fig. 1 - Jump Squat

O treinamento baseado em velocidade (do inglês, Velocity Based Training - VBT) é um método para avaliar a intensidade de um determinado movimento através do cálculo do deslocamento e do tempo através do monitoramento da velocidade da barra ou do corpo. Por muitos anos, o método padrão usados pelos preparadores físicos era determinar o peso dessa carga com base em uma porcentagem de uma repetição máxima (1RM). O VBT, por outro lado, é baseado na velocidade de um movimento ou carga levantada (SIGNORE, 2022).

Pesquisa na Espanha revelou algumas descobertas importantes sobre alguns dos benefícios do VBT (GONZÁLEZ-BADILLO e SÁNCHEZ-MEDINA, 2010):
  • As pessoas que treinam com velocidade máxima durante a fase concêntrica de um levantamento ou movimento obtêm melhores resultados de força e potência do que aquelas que não treinam com a velocidade máxima pretendida.
  • A velocidade diminui de forma bastante linear em um conjunto de exercícios tradicionais de treinamento de força, como supino e agachamento. 
  • A velocidade está intimamente relacionada com a porcentagem do 1RM.
O princípio da Adaptação Específica das Demandas Impostas (do inglês, Specific Adaptation of the Imposed Demands SAID) afirma que o treinamento deve criar adaptação ou característica necessária para se destacar no esporte desejado. No entanto, o tipo de adaptação necessária muda mês para mês e de atleta para atleta com base na composição anatômica. Uma das principais vantagens do VBT é a capacidade de atletas e preparadores físicos garantirem que a característica desejada que estão tentando alcançar esteja em desenvolvimento. Cada tipo de força ou característica tem uma velocidade. Se não estamos treinando na zona necessária ou velocidade desejada, então não estamos desenvolvendo força ou característica que estamos perseguindo. É aqui que entram em jogo as zonas de força especiais, vide figura 2 (SIGNORE, 2022). 

Fig. 2 - Os tipos de força e onde elas se localizam na curva de Força - Velocidade
adaptado de Signore, 2022

O VBT é uma realidade quando o assunto é treinamento de força no futebol. Pois segundo Loturco, et al, 2015, o agachamento com salto (do inglês, Jump Squat, figura 1) é um dos exercícios mais utilizados para melhorar a produção de potência da parte inferior do corpo, o que influencia no desempenho esportivo. O treinamento de força/potência e velocidade para a melhora do desempenho no futebol necessita de um volume baixo, velocidade alta (aproximadamente 1m/s). Conforme na figura 2, o que corresponde na curva força/velocidade a característica de velocidade-força, importantíssima para a prática do futebol e se encaixa perfeitamente na rotina diária de treinamentos. O treinamento com velocidades altas é a forma mais efetiva para se aumentar a potência e a velocidade, sendo também efetivo para o aumento da força (MORRISSEY, et al, 1998). A execução de repetições em altas velocidades impõe demandas metabólicas menores em exercícios tais como extensões de joelho, agachamento, remada e rosca bíceps, em comparação com a execução de repetições com velocidades baixas ou moderadas (BALLOR et al, 1987). Destarte, o treinamento para potência é executado de melhor forma com cargas leves (entre 30%  - 40%  do peso corporal) em velocidades máximas (WILSON et al, 1993). Cenário perfeito tanto para o pré-treino em academia como exercícios no campo durante um morfociclo.

Comenta aqui qual a sua experiência com o VBT. E se você ainda não utiliza, vale muito a pena começar.

Boa semana!

Referências

SIGNORE, N. Velocity Based Training: how to apply science, technology, and data to maximize performance. Champaign, IL: Human Kinetics, 2022.

GONZÁLEZ-BADILLO, J.J, and SÁNCHEZ-MEDINA, L. 2010. Movement velocity as a measure of loading intensity in resistance training. International Journal of Sports Medicine. 31(5):347-352. www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/19966589.

LOTURCO, I. et, al. 2015. Determining the Optimum Power Load in Jump Squat using the mean propulsive velocity. PLoS ONE 10:(10):e0140102. https://www.narsp.com.br 

MORRISSEY, M.C., et al. 1998. Early phase differential effects of slow and fast barbell squat training. American Journal of Sports Medicine 26: 221-230.

BALLOR, D.L. et al. 1987. Metabolic responses during hydraulic resistance exercise. Medicine and Science in Sports and Exercise 19: 363-367.

WILSON, G.J., et al. 1993. The opyimal training load for the development of dynamic athletic performane. Medicine and Science in Sports and Exercise 25: 1279-1286.


segunda-feira, 5 de setembro de 2022

TREINAMENTO CONCORRENTE NO FUTEBOL

 


Atualmente o jogo/treinamento de futebol vem sendo dissecado e essas informações estão disponíveis das mais variadas formas, sejam por publicações científicas, divulgações em  programas esportivos, entre outros canais.

No futebol mundial, os jogadores podem correr em média 10,8 Km com distâncias em alta velocidade chegando em até 24 sprints altamente intensos e mais de 20 cabeceios e contatos em todo o período do jogo (aproximadamente 100 minutos).

Fica claro que, a partir de dados de jogos/treinos, que os atletas são exigidos com uma alta capacidade de metabolismo aeróbico, além da capacidade de gerar forças significativas estática e dinamicamente em um jogo para produzir altas velocidades de corrida e acelerações/desacelerações frequentes. Esses atletas precisam absorver e transmitir ações envolvendo o contato corporal de várias forças-g.

O treinamento concorrente pode ser definido como o treinamento específico das capacidades de resistência e força em sucessão imediata ou com até 24 horas de recuperação separando os dois modos de exercício. No desenvolvimento do potencial atlético em todos os esportes, unidades de treinamento são construídas e periodizadas para treinar os componentes funcionais críticos para o sucesso esportivo. O tempo de treinamento é uma mercadoria finita; por isso, os preparadores físicos treinam múltiplas capacidades em blocos para maximizar a resposta a este estímulo de treino. Ao treinar concorrentemente tanto as capacidades de resistência quanto de força, pode ocorrer interferência quando o desenvolvimento da outra capacidade comparada ao treinamento de qualquer uma das capacidades de forma independente e isolada.

A pesquisa sobre os efeitos do treinamento concorrente em indivíduos de elite e treinados é mais ponderada para demonstrar um efeito de interferência. Parece que em indivíduos bem treinados, o treinamento concorrente interfere no desenvolvimento de força e potência. 
  • O treinamento concorrente afeta a taxa de desenvolvimento de força ou potência de forma mais significativa do que de força absoluta;
  • Grandes volumes de treinamento de resistência, em termos de intensidade e frequência, têm o maior impacto no desenvolvimento de força no treinamento concorrente;
  • A resistência é apenas minimamente afetada pela introdução do treinamento de força concorrente (STEWART, 2014).
Na mesma linha de raciocínio Kenney, Wilmore e Costill (2013) afirmam que, para o atleta que treina ao mesmo tempo para resistência aeróbica e força, os resultados publicados até agora indicam que pode haver ganhos de força, potência e resistência. Contudo, os ganhos de força e potência musculares são menos expressivos quando o treinamento de força é combinado com o treinamento de resistência, em comparação com o treinamento realizado exclusivamente para o ganho de força.

Destarte, podemos afirmar então que, para aquele grupo de jogadores que participam mais das partidas (Grupo 1) a participação nos jogos já os condiciona no requisito resistência e a força e potência diminuem (haja vista que um dos mais utilizados testes de fadiga pós-jogo é o Counter Movement Jump [CMJ]).  Dito isso, o foco deve ser no treinamento de força e potência. Para aqueles jogadores relacionados para as partidas, mas que, não vem atuando tanto (Grupo 2) precisam de um trabalho para mantê-los condicionados e aptos para quando forem participar das partidas. Um treinamento intervalado de alta intensidade (HIIT) pode ser uma solução. Já para aquele grupo de jogadores que apenas treina (Grupo 3) e não é relacionado para os jogos, um trabalho extra se torna necessário para que estes fiquem em nível de condicionamento próximos dos seus colegas de trabalho.  

Com base nesses relatos, se faz necessário olhar mais para os treinos de força e potência em jogadores de futebol como uma forma de aprimorar aquilo que eles já fazem muito bem (sendo que, estes tenham um bom desempenho na resistência). Pois o jogo de futebol atual exige muito dessa capacidade física dos seus participantes. Com a quantidade grande de jogos por temporada (no Brasil um time de elite faz em média 69 partidas), não é mais segredo para ninguém que, o treinamento de força pode reduzir o risco de lesão na maioria dos esportes, levando em consideração que indivíduos fatigados correm mais risco de sofrer uma lesão. 

Boa semana!

Referências

STEWART, Glenn. Minimising the Interference Effect. in: JOYCE, David; LEWINDON, Daniel (editors). High-Performance Training for Sports.  Human Kinetics, 2014 p. 269-276.

KENNEY, Larry W.; WILMORE, Jack H.; COSTILL, David L. Fisiologia do Exercício. Barueri, SP. Manole, 2013.

segunda-feira, 29 de agosto de 2022

FORÇA EXPLOSIVA E SUAS ESPECIFICIDADES NO FUTEBOL

Foto 1: Cristiano Ronaldo salta 2,57 metros e supera goleiro 

A força para nós tem uma importância essencial, é considerada a gênesis da motricidade humana. Força é tudo que causa mudança no estado de movimento. Isto posto, que o jogador de futebol necessita da força não há dúvida, pois a força durante o jogo é representada em vários aspectos. Mas, vamos nos ater apenas na força explosiva. 

Força Explosiva (Força e Velocidade): é a capacidade demonstrada na superação de certa resistência no menor tempo possível, e é caracterizada pelo sistema neuromuscular mobilizador do potencial funcional com a finalidade de alcançar altos níveis de força. A força explosiva representa particularmente a manifestação das capacidades de força e de velocidade relacionadas com o esforço em uma ou poucas repetições (saltos, lançamentos, etc.).

Gomes e Souza, 2008

Já está bem documentado na literatura que o aumento da força máxima melhora a força explosiva e essa, está intimamente ligada aos momentos mais decisivos do jogo, como o gol, por exemplo. Destarte, se a força máxima for treinada em demasia ela pode ocasionar um aumento na secção transversa tanto das fibras de contração rápida quanto das de contração lenta e isso, é prejudicial para a força explosiva. 

A velha metodologia de treino previa, para o início da preparação, um período de treinamento dirigido exclusivamente à melhoria da força máxima (2 a 3 meses) e, posteriormente, um período de transformação seguido de um outra de força especial. As novas proposições, com base em experiências baseadas em evidências e comprovadas no campo, prevêem trabalhos de força máxima e de força explosiva durante o mesmo período (BOSCO, 2007). A adaptação biológica de origem neural que ocorre como resposta inicial aos estímulos promovidos pelo treinamento da força máxima é fenômeno já bem documentado (MORITANI e de VRIES, 1980). É bem provável que os fatores neurais atuem em diversos níveis do sistema nervoso central e periférico, determinando como resultado final a ativação máxima de várias unidades motoras envolvidas (BOSCO, 2007). 

Campograma 1: Jogo Fractal para Força Explosiva

No campograma 1 trago um exemplo de como trabalhei essa questão nas pré-temporadas dos anos de 2020 e 2021. Trabalho de força máxima agachamento (4 X 4 com 85% do 1 RM) e após o tempo de descanso um jogo fractal onde se enfrentavam duas equipes com 5 jogadores (3 dentro do quadrado e 2 por fora, nas laterais). O objetivo era buscar a progressão com passes verticais e cada vez que isso fosse alcançado com sucesso, o jogador que realizou o passe realiza uma aceleração e um salto sobre a barreira fixa na lateral do campo e ocupa o lugar do jogador que ali estava, o jogador recebedor do passe entra no espaço conduzindo a bola e busca o passe vertical na outra lateral (pontuando após cada salto na barreira).

Sempre em busca da especificidade, lembrando que, essa relação de especificidade ou semelhança pode ser criada de três formas no treinamento:
  • Especificidade Metabólica;
  • Especificidade Neural; e
  • Especificidade Mecânica.  
No futebol, assim como em outras modalidades esportivas (ciclismo, voleibol, natação, ginástica, entre outras), não devemos buscar um ganho excessivo de hipertrofia muscular. Devemos buscar um ganho de força ótima. Outro ponto que deve ser lembrado é a questão do treinamento concorrente (que no futebol a sua ocorrência é muito grande). Mas isso, será um tema para o futuro.

Boa semana!

Referências

GOMES, Antônio Carlos; SOUZA, Juvenilson. Futebol: treinamento desportivo de alto rendimento. Porto Alegre: Artmed, 2008.

BOSCO, Carmelo. A Força Muscular: aspectos fisiológicos e aplicações práticas. São Paulo: Phorte, 2007.

MORITANI, T. ; de VRIES, H. A. Potential for gross muscle hypertrophy in older men. Journal of Gerontology. v. 35, p. 672-682, 1980.
 


segunda-feira, 22 de agosto de 2022

VOCÊ CONHECE IMA?


Figura 1: Inertial Movement Analysis (IMA) adaptado de Rabelo, 2016


Com o advento das tecnologias no meio desportivo, a ciência também vem evoluindo cada vez mais para auxiliar os métodos de treinamento, o seu controle e o monitoramento de cargas de treinamento. E novos postos de trabalho vem ganhando notoriedade no futebol, o fisiologista é um exemplo disso.

O uso do Global Positioning System (GPS), é uma tecnologia de navegação baseada em satélite, fornecendo assim um meio adicional para descrever e compreender o contexto espacial da atividade física. O GPS foi utilizado pela primeira vez para rastreamento de atletas no ano de 1997. O seu uso é cada vez mais utilizado pois, ele possibilita ao fisiologista, treinador e preparador físico uma análise abrangente e em tempo real da performance do jogador em jogos oficiais bem como nos treinamentos.

O GPS consegue fornecer dados referentes a diversas variáveis, dentre os mais importantes temos o Inertial Movement Analysis (IMA). Que é um algoritmo científico que remove os erros inerentes de sensores inerciais (acelerômetros, giroscópios e magnetômetros que medem a força, direção e inclinação). O IMA remove a força da gravidade com um filtro que gera, informações precisas e validada de acelerações, desacelerações, mudanças de direção e saltos (altura e frequência) (PIAZZI, FORNAZIERO, MARIA, 2021). Os referidos autores seguem relatando que, a criação de parâmetros de aceleração nos três planos de movimento que consideram a gravidade fornecem uma plataforma para desenvolver algoritmos para detectar micromovimentos específicos dos esportes, convertendo em informações relacionadas a movimentos multidirecionais que são importantes para a prescrição atual do treinamento.

Campograma 1: Jogo Fractal 3 VS 3 Top 1 Neural IMA per Minute

No campograma 1 temos um Jogo Fractal 3 VS 3 com dimensões de 27m X 22m com área relativa 99 m2 e IMA Total 21,3/m (RABELO, 2016). Com esse jogo conseguimos obter um grande número de acelerações/desacelerações e mudanças de direção (Change of Direction [CoD]) tanto para à direita quanto para à esquerda (quanto a tática trabalhar o triângulo defensivo). Outra questão pertinente que devemos relatar é que, a situação de igualdade numérica aumenta a demanda física dos jogadores (na figura 1 temos a seta vermelha significando alta demanda, a laranja média demanda e a azul baixa demanda). 

Se você não dispõe de dispositivos de GPS, esse é um ótimo exemplo para organizar e gerir o processo de treinamento sem essa tecnologia e obter resultados próximos com um baixo custo financeiro.

Boa semana!

Referências

RABELO, Felipe Nunes. Métricas para Avaliar os Jogos Reduzidos. Catapult Performance Workshop. Curitiba, 2016 - Não Publicado.

PIAZZI, Alessandro F.; FORNAZIERO, André M.; MARIA, Thiago Santi. Controle de Carga de Trabalho no Futebol in: MARIA, Thiago Santi.; BOTTINO, Altamiro A. Fisiologia do Exercício Aplicada ao Futebol. 2021. p. 122-149.





segunda-feira, 15 de agosto de 2022

JOGOS REDUZIDOS UTILIZADOS COMO ARMA HIIT


 


"O Futebol não é ciência, 
mas a ciência pode ajudar a melhorar o nível do Futebol"
                                                                      Jens Bangsbo

O uso de jogos reduzidos (para nós Jogos Fractais) para treinamento de futebol além de trabalhar as habilidades técnicas em ambiente específico e a consciência tática, podem e devem ser utilizados para aprimorar as respostas metabólicas e neuromusculares. Se compararmos essas respostas para atender às demandas, isso pode ajudar a garantir uma carga ótima (nem muito, nem muito pouco) e encontrar o equilíbrio entre trabalho/recuperação mais gerenciável de um dia para outro. Um dos desafios de avaliar as demandas do jogo, no entanto, é que a intensidade e a densidade das ações provavelmente são dependentes do tempo, ou seja, quanto maior o período de jogo, menor a intensidade média desse período. 

No campograma acima temos um jogo fractal onde se enfrentam 8 VS 8 em um campo com dimensões de 73 m X 68 m com o objetivo de fazer a bola chegar até a área demarcada (em forma de passe para um companheiro, já trabalhando o passe no intervalo entre zagueiro e lateral) pelos bonecos para poder pontuar. A duração do trabalho é de 4 X 5 minutos. Esse trabalho é considerado o número 1 quando queremos trabalhar High Speed Distance per Minute (carga neural) pois, teremos distância percorridas acima de 20 Km/h com 8,3 m/min em uma área relativa de 310,3 metros quadrados (RABELO, 2016). 

A distância percorrida acima de 19,8 Km/h (5,5 m/s) tem sido usada para quantificar as demandas de High Speed Running (HSR) no futebol (essas demandas equivalem a 2% do tempo de jogo) e 25,2 Km/h (7m/s) para mensurar os sprints (essas demandas equivalem a 1% do tempo do jogo).  Portanto, HSR absoluta é a distância percorrida igual ou superior a 5,5 m/s (esses são os momentos mais decisivos do jogo de futebol). Mais recentemente, os perfis de atividade da partida durante os períodos de Bola em Jogo (BiP) foram relatados para fornecer uma representação mais precisa das demandas da partida em comparação com as variáveis ​​da partida inteira. Os autores também isolaram passagens fixas de BiP em períodos de 30-60 s, 60-90 s e >90 s, para entender a relação entre a intensidade de corrida e a duração dos períodos de BiP. Além disso, a investigação das saídas máximas para cada métrica de GPS (em vez da média) foi pensada para revelar as demandas de pico do jogo, também conhecido como pior cenário. De acordo com o estudo, houve valores mais elevados para a demanda de pico em relação à média, com os maiores valores alcançados durante os períodos mais curtos (de 30-60 s) (MERNAGH, et al., 2021). O que corrobora os dados de Rabelo, 2016. 

Informações como essas precisam ser conhecidas pelas comissões técnicas, pois, o nível das equipes em competitividade fez surgir novos estudos sobre demandas competitivas (físicas, fisiológicas, metabólicas e técnicas) necessárias aos atletas de alto rendimento, seja durante os treinamentos ou nas competições (PIAZZI; FORNAZIERO; MARIA, 2021). Para organizar os treinamentos durante a semana e identificar o perfil exato do objetivo desta atividade e distribuir as cargas durante a semana, para prospectar a carga de trabalho que será oferecida à equipe e ajustar parâmetros de volume e intensidade para que a carga fique dentro do que foi programado e proposto para aquele dia e tente aproximar cada vez mais o treinamento do que acontece no jogo.

Na sequência de postagens traremos mais alguns exemplos de treinamentos com outros objetivos.

Boa semana!

Referências

RABELO, Felipe Nunes. Métricas para Avaliar os Jogos Reduzidos. Catapult Performance Workshop. Curitiba, 2016 - Não Publicado.

PIAZZI, Alessandro F.; FORNAZIERO, André M.; MARIA, Thiago Santi. Controle de Carga de Trabalho no Futebol in: MARIA, Thiago Santi.; BOTTINO, Altamiro A. Fisiologia do Exercício Aplicada ao Futebol. 2021. p. 122-149.

MERNAGH, Dylan; et al. A comparison of match demands using ball-in-play versus whole match data in profissional soccer players of the English Championship. Sports 20219, 76. Disponível em: https://doi.org/10.3390/sports9060076


segunda-feira, 8 de agosto de 2022

ALVOS FISIOLÓGICOS DO HIIT NO FUTEBOL


O  HIIT (High Intensity Interval Training), traduzido Treinamento Intervalado de Alta Intensidade não é algo novo. As primeiras informações dessa metodologia de treinamento datam da década de 1930 (do século passado). 

As sessões de treinamentos influenciadas por essa metodologia tem como objetivos estímulos curtos (de 3 segundos até 5 minutos), porém com alta intensidade (igual ou superior a 85% da capacidade aeróbica máxima). 

Apoiados nos autores Laursen & Buchheit (2018) que fazem uma analogia com soldados indo para a guerra, necessitamos fabricar armas para eliminarmos os nossos alvos. Baseados em evidências práticas, nos seus antecessores e em ciências, os autores definem que existem cinco (5) armas e/ou formatos principais que podem ser usados em treinamentos e que podem induzir a resposta fisiológica aguda apropriada para os nossos objetivos. E essas são:
  1. Intervalos Curtos;
  2. Intervalos Longos;
  3. Treinamento de Sprint Repetidos;
  4. Treinamento de Intervalo de Sprint; e
  5. HIIT Baseado em Jogos
Os referidos autores prosseguem afirmando que, essas armas podem ser usadas para diferentes operações de combate, dependendo dos nossos alvos fisiológicos. 

No caso específico do futebol, vamos falar do HIIT Baseado em Jogos que, incluem os Jogos Reduzidos. Estes são em última análise, formas de intervalos longos baseados em jogos específicos (especificidade do esporte). Além de incluir sistematicamente a tomada de decisões e interações com os oponentes e companheiros, com duração entre 2 minutos e 4 minutos em uma intensidade de esforço específica do esporte.


Tal como em muitos desportos, há organização da maioria dos treinos baseados em jogos no formato de jogos reduzidos se justifica conforme imagem acima. No gráfico de pizza podemos ver as habilidades técnicas com 45%, a consciência tática com 30% e o condicionamento físico representa 25% das capacidades dos jogadores (BUCHHEIT, et. al., 2018). 

Além disso, programas de treinamento de várias semanas usando jogos reduzidos como uma arma HIIT, relataram melhorias em vários fatores relacionados à vitória, incluindo velocidade, força e desempenho de resistência, mas também, e provavelmente mais importante, proficiência técnica e consciência tática, confirmando o potencial dessa abordagem como um forte alternativa ao HIIT baseado em corrida (BUCHHEIT, et. al., 2018). 

O argumento final para o uso de jogos reduzidos para atingir alvos fisiológicos como arma HIIT é que eles são semelhantes às diferentes estratégias disponíveis para modular a intensidade do exercício durante um HIIT baseado em corrida e, por sua vez, as respostas metabólicas e locomotoras. A carga fisiológica e locomotora durante os jogos reduzidos pode ser ajustada usando, entre outras, manipulações as dimensões do campo, número de jogadores e regras (BUCHHEIT, et. al., 2018). 

Porém, se faz necessário a inclusão de HIIT baseado em corrida nos treinamentos para aprimorar o condicionamento físico dos jogadores.

No próximo post traremos exemplos práticos desses jogos reduzidos (porém, nós preferimos denomina-los Jogos Fractais).

Boa semana!

Referências
    
LAURSEN, Paul; BUCHHEIT, Martin. Science and Application of High-Intensity Interval Training: solutions to the programming puzzle. Human Kinetics, 2018.

BUCHHEIT, Martin; et.al. Soccer in: LAURSEN, Paul; BUCHHEIT, Martin. Science and Application of High-Intensity Interval Training: solutions to the programming puzzle. Human Kinetics, 2018. p. 547 - 564. 
                        

segunda-feira, 1 de agosto de 2022

TRANSIÇÕES SUPORTADAS PELO EQUILÍBRIO


No jogo atual, falar apenas de ataque e defesa, é falar de algo que não é futebol. Sou defensor da não fragmentação do treino/jogo, mas para melhor entendimento, esses momentos devem ser tratados em separado. 

A velocidade que se joga atualmente não permite mais que, como acontecia há alguns anos atrás, os jogadores tenham tempo para pensar e realizar calmamente as suas ações quando ganhavam ou perdiam a bola. Seja porque se defende mais à frente, seja pela origem do pressing, seja pela evolução técnica dos jogadores e dos materiais (bolas, chuteiras, gramados [embora no Brasil esse assunto seja muito discutível]), o jogador atual, quando perde a bola não pode deslocar-se lentamente para ocupar a sua posição e, quando a recupera, não pode demorar para retirá-la do setor onde a recuperou. 

Os dois momentos mais importantes do jogo atual são o momento em que se perde a bola e o momento em que se ganha a bola (MOURINHO, apud AMIERIO, 2004). 

A eficácia dos momentos de transição está intimamente relacionada com o modo como a equipe está organizada antes dos mesmos. Ou seja, equilíbrio defensivo no ataque e equilíbrio ofensivo na defesa (AMIERIO, 2004). 

Apoiado pelo mesmo conceito Carvalhal (2006) defende que ninguém consegue atacar bem se não tiver a equipe equilibrada para defender e ninguém consegue defender bem se não tiver a equipe equilibrada para atacar. 

Figura 1: A balança representa o equilíbrio entre os momentos

Sustentados nos depoimentos acima citados e pela figura 1, atrevemo-nos, então, a salientar que, quando em posse de bola, a equipe deve estar dotada de determinados comportamentos, que permitam atacar mas ao mesmo tempo estar posicionada para responder convenientemente a uma situação de perda da posse de bola. Acreditamos que estes comportamentos da equipe devem ser assegurados pelos jogadores sem bola, adotando um posicionamento que lhes permita participar no momento ofensivo mas, ao mesmo tempo, garantir segurança defensiva perante uma possível perda da posse da bola. Porque o ataca e a defesa são unidos, que não pode-se separar.  

Outra situação que não podemos deixar de mencionar sobre as transições é que eles se norteiam nos Princípios Fundamentais do Futebol:
  • Refutar a inferioridade numérica;
  • Evitar a igualdade numérica; 
  • Criar a superioridade numérica. 
E quando a equipe se encontrar no momento sem a bola (defesa) os jogadores devem situar-se entre os oponentes (sem a bola), para realizar a pressão. Na minha visão, o modo de defender é estar entre oponentes. Nunca declarar ao adversário que estou marcando ele. Amierio (2004) identifica duas principais formas de organização defensiva: defesa homem-a-homem e defesa à zona, sendo que não existe apenas uma forma de defesa homem-a-homem, como também não existe uma única forma de defender à zona. As referidas formas de organização defensiva se distinguem muito significativamente. Na primeira a grande referência de marcação são os espaços considerados valiosos, já na segunda são os oponentes diretos, ou seja, quando defendemos à zona procuramos defender os espaços considerados mais valiosos, e quando defendemos homem-a-homem devemos defender exclusivamente um adversário direto. 

Na mesma linha de raciocínio temos Frade (2005), afirmando que, uma equipe quando defende, deve fazer campo pequeno, reduzir o espaço de jogo à equipe oponente, ter os setores mais próximos entre si e conseguir superioridade numérica no setor da bola. E quando ataca, deve fazer campo grande, ocupando corredores e dando profundidade e largura ao jogo. Se a equipe defende no homem-a-homem isto se torna muito difícil (para não dizer impossível) pois, com as movimentações dos oponentes os jogadores da nossa equipe serão levados para determinados espações que não são os mais específicos para retirar a bola do setor de pressão e mantê-la para iniciar o ataque rápido (muito chamam de contra-ataque e o confundem com as transições).

A transição é o momento em que se passa do processo defensivo para o processo ofensivo (transição ofensiva) e do processo ofensivo para o processo defensivo (transição defensiva). Portanto, um caminho de mão dupla. 

Então, como pudemos observar até aqui o modelo de jogo influencia a forma de desgaste físico/mental do jogador e pode ser benéfico e/ou prejudicial para a equipe. Por exemplo, só correr na fase ofensiva e não na fase defensiva causa desequilíbrio tático na equipe. Outro fator que deve ser levado em consideração nas transições é a VEL (Velocidade de Passes entre os jogadores) se é alta e/ou baixa. Isso para retirar a bola do setor de pressão, mudar a bola de corredor e dificultar a montagem do bloco defensivo por parte da equipe oponente. A REC 5 (Recuperar a Posse de Bola em até 5 segundos) se não for possível organizar o bloco defensivo (essa última tem relação significativa com a base física dos jogadores). 

As transições devem ser equilibradas durante as partidas e nas transições a mente atua antes do corpo, a equipe que não conseguir equacionar isso está fadada ao desequilíbrio tático.

Boa semana a todos!

Referências

AMIERIO, Nuno. Defesa à Zona no Futebol. Um pretexto para reflectir sobre o <<jogar>>...bem, ganhando! Edição do autor. Porto, 2004.

FRADE, Vítor. Apontamentos da disciplina Metodologia Aplicada I - Opção de Futebol. Não publicada. FCDEF-UP. Porto, 2005.

CARVALHAL, Carlos. Entrevista. In A importância dos momentos de transição (ataque-defesa e defesa-ataque) num determinado entendimento do jogo. Dissertação de Licenciatura. Não publicado. FADE-UP. Porto, 2006. 




 



 






 

quarta-feira, 20 de julho de 2022

EPICENTRO DO JOGO, ESPAÇOS DE FASE E JOGO DE POSIÇÃO

                                    Figura 1: Fotograma
Legenda: ACB= Atacante com a Bola; ASB= Atacante sem a Bola; DSB= Defensor sem a Bola

Muitas pessoas não gostam de futebol. Sim, eu já ouvi muito isso na minha vida. Por outro lado, existem muitas pessoas espalhadas pelo mundo que dedicam grande parte das suas vidas a esse esporte. O Brasil é considerado o "País do Futebol" (no site de busca mais famoso encontramos aproximadamente 33.100.000 resultados sobre esse tema). Alguns tratam o esporte futebol como sendo algo simples, uma equipe que ataca e a outra que se defende. E seguem dizendo que, "se nenhuma das duas equipes errar, o resultado será 0 X 0". 

Confesso, eu já fui um desses. Míope pela paixão, assistindo jogos e não compreendendo a complexidade que eles nos mostram.

Para que possamos começar a compreender a complexidade do jogo de futebol, devemos entender sobre às referências espaciais. Olhando o fotograma acima, temos dentro do círculo vermelho seis (6) jogadores, sendo um deles portador da bola. Destarte, o epicentro do jogo é o local onde se encontra a bola em determinado momento (tempo) do jogo (TEOLDO, et. al. 2015). Apoiados na Geofísica, o epicentro é o ponto da superfície da Terra onde primeiramente chega a onda sísmica. Entretanto, o epicentro é o ponto de maior concentração e/ou liberação de energia. Quando relaciono isso com o futebol, quero dizer que, entre todos os elementos e forças de interação que provocam respostas e contra-respostas em outros de um forma variada a cada momento, o maior dentre eles, o que possui mais forças gravitacionais é a bola (PERAITA, 2021). 

O centro do jogo (no fotograma acima representado pelo círculo vermelho) é uma circunferência estabelecida por um raio de 9,15 metros (distância regulamentar no futebol) a partir do epicentro do jogo. Sobre essa referência espacial (zona onde a bola se encontra) irá gerar 22 vetores de força diferentes que vão condicionar todos os comportamentos. Haverá jogadores cujas decisões sobre a sua localização, posicionamento e conduta serão influenciadas (para mais ou para menos) pela posição da bola (PERAITA, 2021). 

Desta forma, podemos classificar os papéis no jogo do seguinte modo:

  • Momento com a Bola
  • Atacante com a Bola (Microssistema de ação de jogo);
  • Atacante sem a Bola no Centro do Jogo (Mesossistema de ação do jogo);
  • Atacante sem a Bola Fora do Centro do Jogo (Macrossistema de ação do jogo).
  •  Momento sem a Bola
  • Defensor do atacante com a Bola (Microssistema de ação de jogo);
  • Defensor do atacante sem a Bola no Centro do Jogo (Mesossistema de ação do jogo);
  • Defensor do atacante sem a Bola Fora do Centro do Jogo (Macrossistema de ação do jogo). 
A partir dessa compreensão, algumas equipes que antes se organizavam apenas para proteger um gol e atacar o outro, começaram a se estruturar em torno da bola. Desse insight, nasce o Jogo de Posição (PERAITA, 2021). Outro fator que merece menção aqui é a REC 5 (recuperar a posse de bola após a sua perda em até 5 segundos), o centro do jogo é uma ótima referência espacial para isso (por isso o seu entendimento tanto por comissão técnica e plantel se faz necessário). Pois, dentro do espaço do centro do jogo é preciso diferenciar, por sua vez, entre o espaço de intervenção, próprio do atacante com a bola e o defensor do atacante com a bola e o espaço de ajuda mútua onde um número reduzido de atacantes sem a bola próximos a ele participam nessa situação ajudando ao executor a concluir sua atuação de maneira exitosa. Entretanto estes acontecimentos estão acontecendo em um lugar concreto do espaço de jogo, a totalidade do espaço restante deve estar ocupada de uma determinada maneira pelo restante dos integrantes da equipe e todos eles devem estar em situação de cooperação com os que estão na interação de ajuda mútua. Os indivíduos que cooperam são ajustados espacialmente ao espaço de intervenção em diferentes coordenadas que atendem aos sistemas de jogo globais que o treinador tenha proposto para essa partida e que tem uma diferente interpretação em função da fase de ataque (momento com a bola) ou defesa (momento sem a bola) em que se encontra à equipe. Destarte, o espaço que ocupam os jogadores que estão cooperando se denomina espaço fora do centro de jogo ou espaços de fase para diferenciá-lo do espaço do centro do jogo. Então temos que toda a equipe está ocupando um espaço de fase segundo a fase tática em que está comprometida e, em algum lugar desse espaço, há um grupo menor que ocupa um espaço singular no entorno da bola que é o espaço de intervenção onde se estabelecem relações de ajuda mútua de um alto valor afetivo (SEIRUL-LO, 2004).

O jogo aparentemente simples para alguns, esconde muitas nuances de ordem coordenativa, afetiva e mental. O jogo de futebol precisa do equilíbrio entre os momentos de "ter a bola" e o "não ter a bola" (fluxo contínuo) suportado por um sentimento organizacional coletivo. 

Ufa, espero que tenham gostado. Prometo ser mais assíduo nas publicações, se tiverem algum assunto que gostariam que eu trate aqui, sou todo ouvidos. Deixem o seu comentário que farei o possível para atender.

Forte Abraço!

Referências

TEOLDO, Israel. GUILHERME, José. GARGANTA, Júlio. Para um futebol jogado com ideias: concepção, treinamento e avaliação do desempenho tático de jogadores e equipes. 1 ed. Curitiba: Appris, 2015.

PERAITA, Agustín. Espaços de Fase: Como Paco Seirul-lo mudou a tática para sempre. 1 ed. Porto Alegre: Simplíssimo, 2021.

SEIRUL-LO, Francisco. Estructura socioafectiva. Master Profesional en Alto Rendimento en Deportes de Equipo. Área Coordenativa, Barcelona. Byomedic - Fundació F.C Barcelona. 


quarta-feira, 26 de agosto de 2020

O QUE É "INTENSIDADE" NO FUTEBOL?

 


Muito se fala hoje em dia em intensidade no jogo do futebol. Mas afinal, o que é "intensidade" no futebol?

Na nossa cultura e consequentemente no futebol uma situação que impera é o verbalismo. Para     que possamos explicar a "intensidade" no futebol teremos que recorrer a tática. 

De uma forma simples, faz sentido afirmar que o conceito de tática pode ser concebido como a gestão (posicionamento e deslocamento/movimentação) do espaço de jogo pelos jogadores e equipe (TEOLDO, et al., 2015). Destarte, estando a equipe (sem a posse da bola) com as suas linhas próximas, realizando uma forte pressão sobre o homem da bola (se possível, em todas as partes do campo) haverá uma intensidade nesse jogar. 

Mas, para que isso seja possível, é preciso treinar. Treinar os princípios táticos defensivos, contenção e cobertura defensiva. Bem como, a equipe que está em posse da bola, precisa treinar os princípios táticos ofensivos, mobilidade e espaço. O princípio da contenção refere-se, basicamente, à ação de oposição do jogador de defesa sobre o portador da bola visando diminuir o espaço de ação ofensiva, restringindo as possibilidades de passe a outro jogador atacante, evitando o drible que favoreça progressão pelo campo de jogo em direção ao gol e, prioritariamente, impedindo a finalização à baliza (CASTELO, 1996). O princípio da cobertura defensiva está relacionado às ações de apoio de um jogador às "cotas" do primeiro defensor, de forma a reforçar a marcação defensiva e a evitar o avanço do portador da bola em direção à baliza (CASTELO, 1996). 


Estas ações táticas permitem digamos assim um "abafamento" "sufoco" em quem estiver com a posse da bola e quando perdê-la, deve-se realizar o perde/pressiona. E isso não tem só haver com os quesitos físicos, técnicos e psicológicos, pois, estes deixam de ter um sentido sem a dimensão tática para as contextualizar, assim como a dimensão tática não tem possibilidade de se exprimir se uma das outras não estiver presente. Compartilhamos a ideia de Teoldo et al., 2015, que não queremos transmitir a ideia de que a dimensão tática é a mais importante do que as demais, e sim salientar que esta assume o papel gerador, catalisador e coordenador informacional específico de cada equipe.

Em suma, para jogar de forma "intensa" é preciso treinar o que o jogo pede!

Referências:

CASTELO, J. Futebol a organização do jogo: Como entender a organização dinâmica de uma equipe de futebol a partir desta compreensão como melhorar o rendimento e a direcção dos jogadores e da equipa. Lisboa: FMH Edições, 1996. 

TEOLDO, I. et al. Para um Futebol Jogado com Ideias: concepção, treinamento e avaliação do desempenho tático de jogadores e equipes. 1 ed. Curitiba: Appris, 2015.