Qual é a quantidade do esforço para as cadeias musculares das pernas durante um treinamento na caixa de areia? Qual a qualidade de um trabalho feito na caixa de areia? Após uma atividade como está, qual a atividade que posso desenvolver para os jogadores sem agravar a fadiga?
No futebol e em qualquer outra atividade física desportiva, treinamos para melhorar a forma de adaptação. E, segundo a teoria e metodologia do treinamento desportivo, temos diferentes tipos de adaptação:
- Fenômenos de adaptação morfológicos;
- Adaptações biopositivas e bionegativas;
- Sistemas de adaptação rápida e lenta;
- Adaptações específicas e não específicas.
Neste caso específico, vamos nos ater no item 2, adaptações biopositivas e bionegativas. Segundo Weineck, 2005, p. 14:
"... se os estímulos forem apresentados qualitativa e quantitativamente de forma - observando-se a capacidade de receber carga de cada sistema biológico -, resulta uma melhora da capacidade de desempenho, pela formação de novas estruturas de suporte (adaptação biopositiva), mais propícias a um bom desempenho. Um excesso de estímulos, por outro lado, leva a uma adaptação bionegativa - também chamada de má adaptação - e apresenta uma exigência exagerada do sistema, com momento de prejuízo."
Se não soubermos quantificar a dosagem do esforço que uma atividade terá sobre a musculatura exigida, poderemos causar uma adaptação bionegativa no jogador se, não dermos o tempo de descanso necessário para essa musculatura.
Na figura acima podemos observar isso no sistema muscular (a) no sistema ligamentar e de sustentação (b) e após uma recuperação incompleta (c). Se isso não for respeitado, muito provavelmente os jogadores estarão trabalhando sempre em um processo aquém do que seriam capazes. Destarte, derrotas começam a surgir e o que se faz, aumentam as demandas físicas de trabalho.
Se estamos tratando do tema causalidade e o binômio desempenho/recuperação, temos que comentar sobre o tempo, correto? Segundo Prigogine (2002, p. 21) "o reaparecimento do paradoxo tempo deve-se essencialmente a dois tipos de descobertas. O primeiro consiste na descoberta das estruturas de não equilíbrio, também chamadas de 'dissipativas'. (...)". A estrutura dissipativa só existe quando o sistema dissipa energia e permanece em interação com o mundo exterior, é isso que ocorre quando se pratica futebol. O sistema busca equilíbrio e as atividades que propomos causam desequilíbrios ao sistema. Assim surge, outro fenômeno, o da auto-organização. De acordo com Morin (2013, p. 282-283) o fenômeno da auto-organização refere-se à aptidão de um sistema para criar novas estruturas e estabelecer um nível novo de ordem e organização, após sofrer perturbações aleatórias, de maneira que quanto mais complexos forem os comportamentos do sistema, mais ele manifestará capacidade para se adaptar em relação ao entorno.
Trabalhar o entorno, não é mudar de terreno, mas, ter a percepção de quê, a movimentação dos jogadores da sua equipe e da equipe contrária como condicionantes da atuação individual do futebolista, pois, os princípios dinâmicos da tomada de decisão e de como esta surge da interação entre neurônios interconectados, se baseiam em modelos em que a decisão se associa a uma transição entre atratores, ou estados estáveis, da rede. Esta transição entre estados é induzida por "
inputs" seletivos associados a um estímulo, que modifica a paisagem dos atratores do sistema, favorecendo a transição entre o atrator neutro e um atrator seletivo, associado a uma escolha categórica (MARTI ORTEGA
apud POL, 2013, p. 25). E, esse processo desgasta mais do que apenas o aspecto físico.
Doravante, Frade (
apud TAMARIT, 2013, p. 131) nos alerta para o estado de falência circunstancial do funcionamento de qualquer átomo ou de qualquer órgão é um estado de parabiose. Este é um processo que relata a união de elementos vivos. Neste caso, representa os estímulos qualitativos do treinamento e com o propósito de articulação que este fenômeno desencadeia, após a desestruturação gerada, faz emergir uma determinada engendração conforme o estímulo que a motivou. Se trata de um processo de auto-organização que concebe o organismo e suas partes constituintes como estruturas dissipativas susceptíveis para aspirarem níveis de complexidade crescentes. Em si, não se respeitando isso, ocorrerá a "paranecrose" (FRADE
apud TAMARIT, 2013, p. 131) que é o fenômeno análogo do descrito na parabiose, pois seus efeitos, pela diferença qualitativa há nível de estímulo, pela não devida contemplação do tempo de recuperação, motiva a morte dos elementos vivos, e sua consequente perda de complexidade por parte do sistema.
Em suma, para entendermos o processo de treinamento, dentro da causalidade binômio desempenho/recuperação não devemos procurar os "picos de forma", mas, níveis de desempenho elevados, ou seja, treinabilidade que permitam que a equipe mantenha um nível de adaptabilidade e funcionalidade e de interação eficaz e eficiente, que perdure durante todo o processo de tempo da competição, e/ou melhor, de jogo a jogo sem causar a "paranecrose".
Referências
MORIN, Edgar.
Ciência com consciência. 15 ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2013.
PRIGOGINE, Ilya.
As leis do caos. São Paulo: Editora UNESP, 2002.
POL, Rafel.
La Preparación Física en el fútbol. El processo de entrenamiento desde las ciencias de la complejidad. MC Sports, 2013.
TAMARIT, Xavier.
Periodización Táctica VS Periodización Táctica: Vítor Frade aclara. MBF, 2013.
WEINECK, Jürgen.
Biologia do Esporte. 7 ed. Barueri - SP: Manole, 2005.